segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Desqualificando para ser "feliz"

Quando aponto defeitos nos outros, estou, na verdade, desejando me sentir melhor. Quanto aponto defeitos nos outros, estou, na verdade, dizendo para mim mesma, com toda insegurança inerente ao ato, que sou melhor do que aquela pessoa.  Fazer o contrário é um exercício diário porque nossa natureza é perversa, má e insegura. Nossa insegurança inerente diz que o vizinho que trocou de carro - e esse ano eu não pude fazer isso, e nem no ano passado... - está envolvido em algo ilícito porque afinal e contas, eu, honesto, não consegui o mesmo feito. Não sei das noites insones, das madrugadas já acordado, das renúncias...mas afinal, que importa. Importa que eu seja melhor apontando o defeito do outro ou que o que o outro tem não é merecido.

"Amigos" fazem isso. "Não quero ser funcionária pública. Estudei muito para jogar meu diploma no lixo". Eu sou funcionária pública com orgulho. Trabalho duro hoje. E também estudei muito. Duas vezes: para conseguir meu diploma e para passar no concurso. Mas minha amiga se vê no direito de me criticar. Por dentro eu sorrio. Nem a casa em que ela mora sequer é dela. Mas ela se vê no direito de criticar de onde eu e meu marido tiramos o sustento da minha família.

"Meu filho é mais alto do que o seu". Diz uma amiga todas as vezes que tem oportunidade. Já sei. Respondo. Ela me diz de novo. De novo. E de novo.  "Meu filho de 13 anos já está na décima namorada e o seu nem beijou ainda" "só fica em casa jogando, desse jeito vai morrer boca virgem...."  Não sei se quero que meu filho saia por aí, precocemente, aos treze anos de idade, e sem maturidade sexual alguma, beijando meninas, para provar alguma coisa. Imagino que se ele quisesse, teria feito esforços em direção a isso. Não vou joga-lo na rua para se enquadrar a um padrão estabelecido por uma pessoa que tem tantas ideias duvidosas a respeito da vida. Dou graças a Deus por ele ficar em casa jogando, pois todas as outras atividades normais ele faz: pratica esporte, faz inglês e o tempo restante ele vai para casa...jogar!! Acredito que as coisas acontecerão naturalmente. Será que meu filho vai ter que sair com alguma menina, de quem ele NAO gosta,  para provar alguma coisa para uma pessoa cuja autoestima é questionável a ponto de ser essencial para ela desqualificar para se sentir melhor?

 Se for um desejo dele, tudo bem. Mas para provar a essa amiga....não sei. Meu filho está preocupado, na verdade é ....em ser feliz....e é com ele que tenho aprendido... Uma vez essa mesma pessoa me disse como trabalhava a autoestima de seu filho. Era assim: "Não fica triste, você é o mais bonito da sala. Olha como os outros meninos são todos feios se comparados a você..."....Fiquei estarrecida. Primeiro porque ela teve coragem de me dizer isso, quando meu filho era da sala do filho dela. Segundo: a autoestima do filho dela estava diretamente relacionada à desqualificação do outro. Quer dizer que mesmo que isso fosse verdade, quando aquela criatura encontrasse alguém que ele julgasse "mais feia, ou inferior (em que????)" do que ele, talvez pulasse de algum prédio. Seria dolorido demais. Imediatamente eu disse: "Não acredito que você compara seu filho com os outros.É dolorido demais...."...ela me disse: "não estou nem aí.". Com essa pessoa aprendi a ensinar meu filho a dar o melhor de si. A ser o melhor...que ele puder ser, e não melhor do que o outro.  Com meu filho mais velho tenho aprendido a ser simplesmente FELIZ. Ele é um menino simples. Vive a vida. Sem anseios. Sem se comparar. Claro que digo a ele que ele é LINDO. E é mesmo, mas jamais faria com ele a crueldade de dizer: "olha como fulano é feio se comparado a você"  Há algumas semanas ele me disse: "Mãe, sou o menino mais feliz do mundo". Ele não se acha superior ou inferior a ninguém....E me treino para ver no meu filho um ser humano normal, com falhas, desejos, qualidades. Nem melhor, nem pior.  Sem desqualificar o outro. Simplesmente feliz. E quando olho para meu filho, e ele me diz que é feliz - o mais feliz do mundo - sinto que a batalha está sendo ganha. MAS do jeito certo. Acho que foi Rubem Alves que disse que da comparação nasce a infelicidade. Acho que concordo integralmente com o que ele disse.